Tuesday, May 29, 2007

Caríssimos leitores!

Não tive muito tempo para renovar meu blog. Mas não saiam daí. Continuem acompanhando que, breve, postarei mais histórias e músicas!

Abraços a todos!

Thursday, April 19, 2007

História Trágico-Marítima III: Terra à vista!


Quando Vasco da Gama chegou, em 1499, Dom Manuel, encantado com as notícias da viagem, idealizou uma nova viagem para as Índias. Ordenou uma nova frota, a maior armada até então organizada pelo reino português e escolheu o homem que lideraria a empreitada: Pedro Álvares Gouveia, conhecido posteriormente como Cabral. Em carta régia, assinada no dia 15 de fevereiro de 1500, o Rei de Portugal manda as seguintes investiduras ao nobre, para liderar a nau-capitânia:

“(...)Fazendo vós a saber, capitães, fidalgos, cavaleiros, escudeiros, mestres e pilotos marinheiros e companhia e oficiais e todas as outras pessoas que aqui enviamos na frota e armada que vai para a Índia, que nós, pela muita confiança que temos em Pedrálvares de Gouveia, fidalgo de nossa Casa, e por conhecermos dele que nisto e em toda outra coisa que lhe encarregamos nos saberá muito bem servir e nos dará de si muito boa conta e recado lhe damos e encarregamos a Capitania Mor de toda a dita frota e armada. (...)Cumprais e façais inteiramente seus requerimentos e mandados assim e tão inteiramente e com aquela diligência e bom cuidado que de vós confiamos e o faríeis se por nós em pessoa vos fosse dito e mandado, porque assim o havemos por bem e nosso serviço e aqueles que assim o fizerem e cumprirem, nos farão nisso muito serviço. (...) Dada em nossa cidade de Lisboa aos 15 dias do mês de fevereiro. Antonio Carneiro a escreveu no Ano de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil e quinhentos”.


Pedro Álvares Cabral nasceu provavelmente, em 1467 ou 1468, em Belmonte, filho de uma nobre fidalguia, que remonta a Álvaro Gil Cabral, cavaleiro que lutou bravamente contra os castelhanos, ao lado do Mestre de Avis, como alcaide-mor do Castelo da Guarda. Na verdade, os Cabrais nasceram neste castelo e era uma linhagem de guerreiros servidores da Coroa. Tais serviços deram direitos hereditários para que a família possuísse os títulos de senhores de Azurara e do Castelo de Guarda e Belmonte. Um ancestral do navegador, o bispo de Guarda Gil Cabral, casou secretamente os amantes Dom Pedro I, rei de Portugal e Inês de Castro. E em nome disso, a sobrinha do bispo, Maria Gil Cabral, herdou todos os bens que o rei deixou ao eclesiástico. O pai de Pedro Álvares Cabral, Fernão Álvares Cabral, o “gigante da Beira”, era Cavaleiro da Ordem de Cristo e serviu o infante Henrique nas batalhas ao norte da África. A fama de “gigante” era devido a uma peculiaridade da família dos Cabrais: eram homens altíssimos, de dois metros de altura. Isso era assustador para a época, já que a grande maioria dos portugueses do século XV mal chegava a um metro e meio de altura. Era o segundo membro da família, e como tal, não herdara o nome dos Cabrais, sendo batizado, primeiramente, como Pedro Álvares Gouveia, sobrenome materno. O morgadio pertencia a seu irmão, João Fernandes Cabral, herdeiro do nome da família.

Belmonte não passava de uma cidade sonolenta, com apenas cem habitantes, quando adolescente, Pedro Álvares Gouveia foi mandado para a Corte, em Lisboa, estudar literatura, história, ciência, marinharia e artes militares. Na prática, os fidalgos da terra eram apresentados ao rei, em busca de fama, glória, sucesso e mesmo formar quadros militares e políticos para a monarquia. Em 1484, foi apresentado, junto com mais cinqüenta jovens, como “moço-fidalgo” da Corte, recebendo uma tença real pelos estudos e pelo rígido treinamento militar.

Foi nesta época que Pedro teve contato com a literatura náutica de seu tempo: era amigo do sábio e polido astrônomo judeu Abraham Zacuto, como de outros estudiosos hebreus de renome do reino. O “Almanaque Perpétuo” era livro de cabeceira dos interessados em ciências náuticas, já que descrevia as tabelas de posição do sol durante todo o ano e era um conhecimento perfeito para quem se interessasse por navegação. Ademais, os Cabrais tinham sólidas ligações com os judeus, já que em na sua cidade natal, existia uma pequena comunidade de “judiaria”, que praticava livremente sua religião e tinha grande amizade com o pai do fidalgo, Dom Fernão, o senhor alcaide das de Belmonte e Azurara. Pedro lia as grandes obras sobre navegação marítima: Imago Mundi, compilação de estudos gregos, latinos e árabes organizada pelo Cardeal Pierre D´Ailly no inicio do século XV, uma obra de geografia muito cultivada entre os portugueses. Aliás, o Imago Mundi possuía teorias de fundo astronômico, que precipitariam os estudos posteriores de Nicolau Copérnico, já que teorizava os movimentos de rotação do planeta Terra sobre si mesmo. Isso porque, ao contrário do mito comum sobre a Idade Média, a obra já descrevia a esfericidade da Terra. Comenta-se que em Portugal, a obra era disputada pelos estudantes fidalgos, já que havia uma rara edição veneziana na biblioteca de Alcóçava. Os relatos de Marco Pólo sobre a China eram outra literatura que encantava os portugueses e era comentado entre os estudiosos professores e sábios das escolas fidalgas e universidades. Em 1487, Pedro Álvares foi elevado a Escudeiro Real e, para receber o batismo de fogo, foi enviado em combate ao Marrocos, contra os mouros na praça de Ceuta ao norte da África. Depois de uma sangrenta peleja contra os infiéis islâmicos, em uma missa especial, fora agraciado cavaleiro pelo Bispo Dom Diogo, na mesma cidade, e preparou-se para os rituais de iniciação na Ordem de Cristo. Vestido com a manta branca, Pedro, como de costume, recebe um leve golpe de espada no pescoço e é outorgado com o título de cavalaria. Em 1492, morre-lhe o pai, Dom Fernão, e seu irmão mais velho, João Fernandes, adquire o nome dos Cabrais, os títulos de senhor de Azurara e Belmonte, enquanto Pedro herda terras em Santarém. Embora isso não fosse comum, já que o primogênito poderia reivindicar direito a todas as propriedades, a família Cabral era bastante unida, e os numerosos irmãos dividiram a partilha. Em 1494, é elevado, finalmente a Cavaleiro da Ordem de Cristo.

Há de se fazer um adendo a essa questão: a Ordem de Cristo foi fundada em 15 de março de 1319, a pedido do rei português Dom Dinis, pela bula papal de João XXII, Ad ae Exquibus. Na prática, a Ordo Militae Jesu Christo era uma refundação da antiga Ordem dos Templários, ordem militar medieval fundada em Jerusalém, por nove cavaleiros francos, entre os quais, Hugo de Payens, em 1118, com o intento de proteger os peregrinos nas viagens da Terra Santa. Seu nome “templário”, diz respeito à sua localidade, nas ruínas do templo do Rei Salomão, nas cercanias da cidade sagrada. Eram verdadeiros monges armados, que faziam votos de pobreza e celibato e se tornaram o braço armado da Igreja. Embora se declarassem os “pobres soldados de Cristo”, durante dois séculos, os templários se tornaram uma das ordens mais poderosas, senão a mais poderosa da Europa. Ainda no século XII, a Ordem dos Templários tinha isenção de obediência de qualquer episcopado e era um órgão totalmente independente de reis e bispados, sendo ligado diretamente ao papa.

Eles, provavelmente, foram os precursores, junto com os prestamistas judeus, do sistema bancário europeu. Só que a diferença estava na eficiência e versatilidade dos nobres templários, já que não sofriam as mesmas restrições civis dos usurários hebreus e tinham um complexo econômico de terras e dinheiro, que compreendiam Portugal, Espanha, França e uma boa parte da Europa. Emprestavam dinheiro a reis e senhores feudais e cobravam juros. Afirma-se, também, que foram empreendedores da conta-corrente e remessa de dinheiro no continente. Uma casa templária, ao transferir dinheiro de uma cidade para outra, evitava, assim, o roubo nas estradas, relativamente comum naquelas épocas. Um burguês ou nobre poderia colocar uma quantidade de ducados de ouro na Espanha e transferir na França, sem precisar levar o dinheiro. Bastava que depositasse em conta-corrente na Espanha, enquanto um cavaleiro da ordem ia direto na França, avisar à outra sede da ordem para liberar o dinheiro.

No final do século XIII, um rei começou a temer e invejar o poder dos templários: Felipe IV, o Belo, rei da França. Homem belo, ambicioso, tirânico, ardiloso e cínico, ao desejar tributar os eclesiásticos e mesmo endividado com Roma e os templários, por causa das guerras do reino, começou a hostilizar o papa Bonifácio VIII. O rei se recusa a pagar impostos a Roma e ameaça o clero francês, confiscando terras, tributando os eclesiásticos e mesmoencarcerando-os. O papa publica uma bula papal, Unam Sancta, em que reivindica a supremacia do poder espiritual da Igreja sobre o poder temporal dos príncipes. No entanto, emissários do rei da França vão a Roma e prendem Bonifácio VIII, que é torturado a mando do rei. Vitima de maus tratos, quando é libertado, em 1304, o papa acaba por falecer. Então Felipe prepara um golpe que abalaria o mundo medieval: mediante chantagem, ameaças de violência e corrupção, elege um cardeal de sua confiança, Bertrand de Gouth, um clérigo inescrupuloso, como papa Clemente V. Os tumultos na Itália, com uma população indignada com a intervenção do exército do rei francês no papado, convenceu a Felipe a transferir o papado. Não somente elegeu um papa sob sua outorga, como instituiu a sede papal para Avignon, em 1309, afrontando a tradição papal romana. Avignon não pertencia ao reino francês, e sim território do rei da Sicília. Porém, o rei da Sicília sofria as influências do reino francês e estava nas mãos de Felipe IV.

Isso deu poderes ao monarca de conspirar e destruir a Ordem dos Templários na França. Em 1307, os cavaleiros templários foram presos, e mediante horríveis torturas, acabaram forçados a assumirem culpas que não tinham: sodomia, idolatria, apostasia. No concilio de Viena, entre 1311 e 1312, a ordem templária foi extinta e posteriormente a maioria dos cavaleiros foi executada na fogueira. Jacques De Moley, o último grão-mestre templário, também foi barbaramente torturado e morto na fogueira, em 1314. Contudo, a Ordem dos Templários fincou suas raízes e sua riqueza vultosa nas terras lusitanas. Muito se discute sobre os tesouros da ordem, já que várias lendas foram criadas a respeito de seu destino. Mas é certo afirmar que a Ordem de Cristo, tal como a sua antiga similar francesa, era muito rica e, posteriormente, bancou uma boa parte dos empreendimentos marítimos do século XV.



De fato, uma boa parte dos bens dos templários, em Portugal, viraram propriedades da nova Ordem fundada pelo rei Dom Dinis. O antigo convento de Tomar, sede da ordem templária, e sua cúpula, assim chamada a “Rotunda”, tornou-se sede da recém-fundada portuguesa. O rei Dom Manuel e demais reis portugueses, em suas audiências, costumava reunir os fidalgos em Tomar, organizando, junto com o mestre da ordem, complexos rituais de iniciação dos novos moços-fidalgos. Mesmo as regras internas da ordem, inspirada nos monges cistercienses e beneditinas, eram as mesmas da Ordem templária. No século XIV, as regras severas de votos de castidade foram abandonadas e os fidalgos poderiam se casar. Pedro Álvares Cabral era filho dessa ordem. Como as velas encorpadas das naus e caravelas portuguesas, com suas cruzes, não negavam às origens de seu empreendimento e patrocínio.

No domingo do dia 8 de março de 1500, depois da missa na Ermida de São Jerônimo e da procissão dos cavaleiros, junto com o séqüito do rei, treze navios, dez naus e três caravelas, a maior frota portuguesa formada para atravessar as Índias, esperavam o capitão-mor Pedro Álvares e mais seus pilotos. Cerca de mil e quinhentos homens acompanhariam a armada. Pedro acabara de receber o estandarte da Ordem de Cristo em mãos e bênçãos do próprio rei. A população esperava na praia do Restelo, na beira do Tejo, na expectativa de saída das naves. Músicas eram tocadas e um povo saudoso jorrava lágrimas de despedida. Os próprios pilotos estavam apreensivos, pois deviam aproveitar as direções das ventanias de março, para que a frota zarpasse, sob pena de perder sua temporada e iniciar toda a trajetória, só no ano seguinte. No entanto, os ventos não ajudaram no dia e a tripulação passou a madrugada inteira esperando, até que só no amanhecer do dia 9 de março, é que conseguiram navegar Tejo abaixo, até chegar ao Atlântico. As doze naves passaram mais de um mês em alto-mar, até chegar às terras do Brasil. Embora tivesse sido uma viagem relativamente pacífica, as calmarias do mar assustavam tanto quanto as tempestades. Os navios ficavam paralisados, boiando de um lado para outro, numa imensidão terrível de águas, sem movimentação e isso entediava toda a tripulação. Por vezes, como faltava, às vezes, comida e água, tripulações inteiras morriam de fome nos navios. No dia 9 de abril de 1500, os portugueses passaram pelo Equador e realizaram seu domingo de Páscoa, quando se encontravam a 250 quilômetros da costa brasileira. Dias depois, encontram algas marítimas, os “botelhos”, e pássaros vindo da região onde se direcionavam, sinais de terras à vista. Na tarde do 22 de abril, aportam em Monte Pascoal, no Brasil.

O impacto da natureza brasileira e dos homens que os lusitanos encontraram nas praias é um dos mais impressionantes choques culturais que se há notícia. Depois de uma reunião entre os capitães da tripulação, os portugueses desceram dos seus batéis para a terra firme e encontraram indivíduos morenos, nus, armados de setas e flechas, que falavam línguas estranhas e eram irreconhecíveis para os europeus sob todos os aspectos. Nicolau Coelho, um dos capitães da armada, pediu para que baixassem as armas e jogou chapéus e gorros para os nativos. Os mesmos retribuíram jogando cocares e colares de penas aos portugueses. Gaspar da Gama, o velho judeu protegido de Vasco da Gama, e o “língua”, o tradutor da frota, tentava falar árabe, hindu e outros demais dialetos sem sucesso. Dois dias depois, os portugueses detiveram dois nativos da terra e os levaram até ao capitão Pedro Álvares. Eles ficaram contemplativos, observando os portugueses, suas roupas, seus objetos de ouro. Assustaram-se quando viram uma galinha no convés; quando beberam vinho, cuspiram. E no final, acabaram por adormecer no assoalho. Os portugueses pegaram um cobertor e abrigaram os índios.

Um brilhante narrador desta história, o escrivão Pero Vaz de Caminha, mostra essa impressão mútua entre os portugueses e nativos, posteriormente chamados “índios”. Caminha era filho de uma burguesia enriquecida e nobilitada, descendente de uma cepa de cartorários e homem de grande educação humanística. Descreve-os da seguinte maneira: “ E tomou uma almadia dous daqueles homens da terra, mancebos e de bons corpos(...) A feição deles e serem pardos, maneira d’avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos..." Se os portugueses tiveram impacto no contato com os primeiros “selvagens”, a Europa inteira, anos depois, deliciou-se com este retrato idílico da humanidade primitiva, fora das vilezas da civilização. Thomas Morus, na literatura, recriou a Utopia, através de relatos portugueses. Na verdade, até o personagem principal da história, Rafael Hitlodeu (ou, no grego, “aquele que conta disparates”) é um navegante português. A mesma impressão teve Montaigne a respeito dos índios brasileiros capturados pelos franceses, e levados ao porto de Havre, na Normandia, por volta de 1550. Enfim, a idéia mítica do bom selvagem contagiou o mundo europeu, durante vários séculos!

No domingo do dia 26 de abril de 1500, Pedro Álvares mandou criar um altar para a missa em terra firme. Era a primeira missa no Brasil, ministrada pelo Frei Henrique de Coimbra. Os nativos ficaram espantados com aqueles complexos rituais em latim. À tarde, os portugueses começaram a tocar música, junto com os índios. No dia seguinte, 27 de abril, os portugueses foram fazer aguada na praia e trocaram seus tradicionais gorros vermelhos de marujos, por cocares, arcos e flechas e papagaios e araras graciosas. Cabral, em sua carta a Dom Manuel, batizou a terra de “Vera Cruz”. No entanto, Dom Manuel ficou insatisfeito com a denominação, porque lembrava a cruz de Marmelar, em que se dizia, o pedaço da cruz de Cristo foi posto na relíquia. Batizou a nova terra de “Santa Cruz”. Porém, muitos portugueses se referiram à terra “achada” como “dos papagaios”, em alusão aos animais. Muito posteriormente, em alusão ao pau-brasil abundante naquela terra e, mesmo à lenda medieval da Ilha do Brasil, a terra foi assim nomeada.

Na noite do dia 27 de abril, o sábio mestre João Faras, astrônomo e matemático, um judeu cristão-novo, tal como Gaspar da Gama, observava os céus escuros do Brasil, quando descobriu o “cruzeiro do sul”, uma constelação vista nos céus do sul do Equador. Na realidade, a descoberta do cruzeiro do sul deu incremento revolucionário a tecnologia náutica portuguesa, já que a estrela do norte, que era o guia fixo para os navegadores identificarem sua posição através das estrelas, não era visto ao sul do Equador. E uma carta a Dom Manuel, João Faras chega a rascunhar cinco pontos, formando uma cruz, e descrevendo a sua descoberta. No dia primeiro de maio de 1500, Cabral mandou erguer uma enorme cruz para fazer sua última missa naquela terra. Os lusitanos fizeram uma verdadeira procissão, com estandartes do reino e da Ordem de Cristo e, acompanhado dos índios, os cerca de mil e quinhentos tripulantes das naves se despediam do lugar. Até hoje se discute as reais intenções dos portugueses, ao explorarem o território do Brasil. Uma boa parte dos historiadores concorda que o “achamento” do Brasil não foi ocasional, foi planejado para fincar o domínio português, dentro do Tratado de Tordesilhas. A ausência de fincar um padrão de pedra, conforme era tradição entre os navegantes portugueses, no sentido de afirmar que aquela terra já tinha dono, presume-se que os lusitanos já tinham consciência da existência dessa terra. A gigantesca cruz, se servia para algo, era para dizer que os portugueses apenas confirmavam aquilo que consideravam seus.

Dois dias depois, partiram, em direção às Índias, para enfrentar as provações do Cabo da Boa Esperança, na atual África do sul. Uma nau, a de mantimentos, guiada por Gaspar de Lemos, foi mandada pra Portugal, com arcos, flechas e estoques de pau-brasil, encontrados no litoral, e mesmo um índio tupiniquim, que foi apresentado às cortes de Lisboa. As cartas dos pilotos, de Pero Vaz de Caminha ao rei, como outras, de marujos que escreviam para suas famílias, seguiram viagem para a terra natal. E o resto seguiu viagem. Descendo mais ao sul, chegaram no cabo tormentoso no dia 23 de maio e foram vítimas de uma tempestade. As crônicas da época comentam que as ondas eram tão altas, que os navios quase voavam pelos mares e os céus negros e fechados apavoravam os tripulantes portugueses, que oravam a Deus e aos santos, para escapar daquela situação. Dizia-se que o ranger da madeira dos cascos dos navios, como se ameaçasse arrebentar, deixaram os marujos consternados. E ocorreu a tragédia: as naus de Aires Gomes, Simão de Pina e Luis Pires, capitães de Cabral, foram engolidos pelo mar, levando mais de trezentos homens. O destino não poderia ser mais paradoxal: a caravela de Bartolomeu Dias, o primeiro homem que atravessou o Cabo Maldito, em 1488, naufragou, junto com mais de oitenta homens. Depois da morte de quase metade da tripulação, dos treze navios, só restaram sete e em 16 de julho, e eles chegaram a ilha de Quiloa, no Quênia, com as naves avariadas e a população esgotada psicologicamente. Prosseguindo viagem, a nau de Diogo Dias, irmão de Bartolomeu, se desgarrou da frota e foi parar no Oriente Médio, pelo Mar Vermelho. Em final de julho, passou por Sofala e não foi bem recebido pelo xeque local, e no dia 2 de agosto, chegou a Melinde. Lá foi bem recebido pelo chefe local e um piloto hindu o guiou até as Índias. Na noite do dia 13 de setembro de 1500, Cabral e sua alquebrada frota chegam a Calicute, na Índia.

Os hindus e islâmicos da cidade opulenta e rica ficaram assustados com as naus portuguesas, fortemente armadas, no porto. Cabral enviou alguns indianos, outrora capturados por Vasco da Gama, e solicitou ao Samorim-rajá (ou o “senhor do mar”), príncipe de Calicute, que desse salvo-conduto aos portugueses, para que descessem em terra firme. Glafer, (assim era o nome do Samorim), era sobrinho do Samorim que havia recebido Vasco de Gama e a despeito dos ressentimentos deixados em 1498, recebeu bem os lusitanos. Para garantir a segurança do capitão-mor, foi exigido que alguns indianos ficassem no navio, como reféns. Passaram-se dias de negociação, até que o problema foi resolvido. Feito o acordo, Cabral desceu da nau-capitania e apresentou uma carta do Rei de Portugal, escrita em árabe, considerando uma aliança entre os dois reinos. O rei também enviou presentes ao príncipe, como moedas de ouro, pratarias, roupas de luxo, sedas e brocados, bem diferente da gafe de Vasco da Gama, que enviou potes de açúcar, melado e bacias de cobre. Todavia, a corte do Samorim era tão rica, que os pobres portugueses eram humilhados pelos brincos, jóias, diamantes e sedas vistosas da corte do príncipe. Para agradar mais ainda o Samorim, a pedidos, Cabral enviou uma caravela com Pero de Ataíde e mais de setenta homens e atacou com canhões uma grande nau islâmica. Capturou uma tripulação de trezentos mouros e mais cinco elefantes e levou a nave para o Samorim.


Foi permitido aos portugueses fazer feitorias no local. Entretanto, os hindus e os árabes ficaram indignados com a interferência dos portugueses. Começaram a boicotar as relações entre os portugueses e o Samorim e as naus lusitanas esperavam, impacientes, a permissão do príncipe para fazer negócios e levar as tão preciosas especiarias da Índia. Os portugueses experimentavam sérias dificuldades para carregar suas naus, já que a situação instável e mesmo a hostilidade árabe impediam de arranjar negociantes. E o príncipe, que poderia autorizar o comércio no local, pressionado pelos mercadores mouros, não fazia nada em favor dos portugueses. No inicio de dezembro, uma nau muçulmana saia de Calicute, abarrotada de especiarias, quando os portugueses, ofendidos com a negligencia do Samorim, aprisionaram o navio, passaram a espada na tripulação e confiscaram as mercadorias. O piloto árabe da nau aprisionada foi ter com o Samorim, exigindo providências para que destronassem os portugueses do local. Os mercadores árabes, junto com os hindus, envenenaram a situação. O Samorim acabou por acatar a decisão e no dia 16 de dezembro de 1500, uma turba de árabes e hindus armados atacou a feitoria portuguesa, matando cinqüenta e quatro lusitanos desprevenidos, entre os quais, o fidalgo Aires Correa e o próprio Pero Vaz de Caminha. O filho de 11 anos de Aires Correa e o frei Henrique de Coimbra fugiram do local, nadando até a nau do capitão Cabral. Informado dos ataques, na manhã do dia 17 de dezembro, Pedro Álvares mandou alinhar os navios e bombardeou a cidade inteira. Suas tropas furiosas saquearam e incendiaram onze navios islâmicos no porto, matando cerca de 600 pessoas. Uma boa parte de Calicute foi devastada pelos canhões no porto e ficou em ruínas. Nas palavras de um piloto da armada: “Nós matamos infinita gente e causamos muito dano”.

Cabral zarpara no dia 20 de dezembro e foi para Cochim, cidade inimiga de Calicute e fez aliança com o Rajá da cidade. Abarrotou suas naus de pimenta do reino, gengibre e canela, além de outras especiarias. Instalou uma feitoria portuguesa na cidade e, no dia 16 de janeiro de 1501, partiu de volta pra Portugal. De volta a Melinde, a nau de Sancho de Tovar encalhou num banco de areia e depois de descarregar as mercadorias em outras naus, Cabral mandou queimar o navio. Sobraram cinco navios a partir. Dobraram o Cabo da Boa Esperança mais ameno, em 22 de maio de 1501 e chegaram a Berzeguiche, atual Dakar, em 2 de julho. Encontraram o navio perdido de Diogo Dias, com sua tripulação de apenas sete homens, esfarrapados, indigentes e esfomeados. No mesmo porto, Cabral encontrou três navios, a mando do Rei Dom Manuel, com a missão de explorar a nova terra descoberta por ele: Brasil.

O primeiro navio da frota de Cabral chegou a Lisboa, em 23 de junho de 1501. Era a nau “Anunciada", bancada pelo banqueiro florentino Bartolomeu Marchioni, que deu satisfações a seus sócios, escrevendo cartas a Florença, sobre a viagem. Cabral chegou quase um mês depois, no dia 21 de julho de 1501 e foi recebido pelo rei e sua corte, em Santarém, a mesma cidade onde o fidalgo de Belmonte morou durante toda a sua vida. Os navios abarrotados de especiarias foram tão lucrativos aos negociantes, investidores e mesmo a Coroa Portuguesa, que as cotações do mercado de Veneza foram alterados abruptamente. Cabral foi premiado com uma pensão de 30 mil reais e se tornou um favorito do rei. Todavia, Cabral caiu em desgraça: Dom Manuel planejava uma nova armada para a conquista das Índias e desforrar contra Calicute, quando o capitão-mor, até então amado e elevado a herói pelo rei e pelas cortes, recusou-se a ir. Isso magoou o rei e Cabral foi condenado ao ostracismo.

Em 1503, Cabral se casa com a donzela Isabel de Castro, sobrinha de Dom Afonso de Albuquerque, posteriormente Duque de Goa e vice-rei da Índia, e a terceira mulher mais rica de Portugal. Passou seus últimos dias em Santarém, a terceira maior cidade portuguesa, com uma população até então de 9 mil habitantes, administrando suas propriedades, enquanto, amargurado, foi relegado ao esquecimento. Posteriormente herdou o nome da família Cabral e ainda se via sua presença, nas liturgias da Ordem de Cristo. Ele provavelmente faleceu em 1519 ou 1520, embora nas contas de pagamento de pensões reais à sua esposa e filhos, datadas de agosto de 1520, há uma citação póstuma: que Deus o perdoe! Seu filho, Fernão Cabral,foi também navegador e capitão da nau São Bento, a mesma que naufragou, junto com o poeta Luis de Camões. Isabel de Castro transladou o corpo do marido, em 1529, para a Igreja da Graça, em Santarém. Em 1534, Isabel foi alçada camareira-mor da infanta Maria, futura esposa do rei Felipe II da Espanha e provavelmente faleceu em 1538, juntando-se a seu marido, no jazigo perpétuo da igreja.

A viagem de Cabral abriu portas para a conquista portuguesa nas Índias. O tio de sua esposa, Afonso de Albuquerque, anos depois, expandirá o domínio lusitano nas Índias e se tornará senhor absoluto de uma parte da Índia, aterrorizando os mouros e hindus da região. Para alguns críticos historiadores orientais, ele iniciou um período colonialismo mais sanguinário e a conquista do mundo pelos europeus. Por intermédio de Cabral que se inicia a história do Brasil e da colonização portuguesa na região, acabando por surgir, séculos depois, uma nova nação. Cabral representa a complexidade do homem europeu: misto de cavaleiro medieval, guerreiro templário da Reconquista Ibérica, e um educado fidalgo da Renascença, investigativo, impetuoso, destemido, inquieto e desafiador. Cabral é como muitos homens de sua época: uma transição entre dois tempos, entre duas realidades que aparentemente se chocam, mas que na prática, representam uma unidade; o agonizante mundo medieval e o nascimento da Idade Moderna. Em suma, um homem fronteiriço dos tempos modernos.


(Cancioneiro de Belém- Século XVI).

Monday, April 02, 2007

História Trágico-marítima II: elevando um reino a império!

(Intrigas políticas, palacianas e guerreiras do reino português: 1385 – 1495).
Portugal do século XV, na política, foi uma das mais controversas. O Mestre de Avis preservou a monarquia, ao expulsar os partidários portugueses e castelhanos da rainha Leonor Teles, derrotando-os no campo de batalha. De fato, a derrota da nobreza feudal portuguesa e castelhana e a união da monarquia com os burgueses, plebeus e pequenos nobres nacionalistas de Lisboa, incrementaram o processo de centralização monárquica de Portugal. A estabilidade do reino português foi consagrada, na medida que uma boa parte do séqüito da nobreza era ligada na pessoa do rei. O Mestre de Avis, ao casar-se com Filipa de Lancaster, em 1387, incrementou uma aliança com a Inglaterra, tirando Portugal do isolamento político. No entanto, alguma ameaça pairava sobre o trono lusitano, quando o infante Dom Dinis, filho do rei Pedro e Inês de Castro, declara-se rei e, com o apoio de Castela invade Portugal, no ano de 1398. No entanto, em Beira, o Condestável Nuno Álvares derrota as tropas de Dom Dinis e a dinastia de Avis, mais uma vez, é salva. Em 1402, Portugal e Espanha assumem a trégua e os partidários portugueses de Castela são perdoados, e, no ano de 1411, assinam a paz, com a devolução dos bens confiscados dos portugueses recalcitrantes.

Um evento particular depois influenciará a história de Portugal: o todo-poderoso homem de Portugal, militar, político, guerreiro e depois, frade carmelita, Nuno Álvares, casa sua filha Beatriz com o filho ilegítimo do Mestre de Avis, o infante Dom Afonso. Anos depois, Afonso é elevado como primeiro duque de Bragança, em 1444. Sua dinastia seria elevada à primazia do reino de Portugal, em 1640. Em 1415, Ceuta foi tomada dos mouros e os portugueses iniciam suas investidas imperialistas ao norte da África. Foi a partir do reinado de João que se iniciaram as navegações marítimas, financiadas por seu filho, o infante Dom Henrique, nomeado Mestre da Ordem de Cristo, em 1416. Dom Henrique era um homem que misturava impetuosidade militar, proselitismo religioso e cobiça pura e simples de riquezas. Não somente financiou uma boa parte das navegações marítimas com as vultosas somas da Ordem de Cristo, como também com os escravos e o ouro descobertos na costa ocidental da África. Em contrapartida, seu empreendimento era caríssimo e embora fosse muito rico, tinha sérios problemas em caixa, por causa das vultosas dívidas de seus empreendimentos náuticos e militares. Criou a Escola de Sagres e bancou uma boa parte dos sábios de sua época, ao aprimorar a tecnologia marítima portuguesa. Quando morreu, em 1460, os portugueses já tinham superado uma boa parte da costa da África.



O Rei João I faleceu em 1433 e foi substituído pelo seu filho Dom Duarte. Dizem que o batismo de seu nome foi em homenagem a seu bisavô, o rei Eduardo III da Inglaterra, já que era filho da rainha inglesa Filipa de Lancaster, neta do rei inglês. Em seu curto reinado, os portugueses conseguiram ultrapassar o Cabo Bojador, abrindo espaço para o domínio da costa oeste da África. Um evento que manchou a reputação do infante Dom Henrique foi quando idealizou o ataque a Tanger, em 1437. No malogro da batalha, os portugueses tiveram muitas baixas e a cidade não foi tomada. Para piorar, o príncipe caçula Dom Fernando, irmão do rei e de Henrique, foi capturado pelos mouros. O rei do Marrocos exigiu a devolução de Ceuta, em troca do resgate do príncipe, mas o próprio Dom Fernando se recusou e morreu no cativeiro. Pela sua abnegação, foi então chamado de “infante santo”. Um ano depois, Dom Duarte morreu, vitimado pela peste.

A morte do rei causou uma situação delicada em Portugal. O príncipe herdeiro, Afonso, ainda não tinha idade para governar e Dom Duarte deixou em testamento, os poderes de regência à rainha, dona Leonor de Aragão. As cortes, receosas do governo de uma estrangeira e espanhola, e sempre temerosas da ameaça de Castela, recusam o testamento real, exilam a rainha para a Espanha e declaram o tio do monarca, Dom Pedro, Duque de Coimbra, como regente. O duque mede esforços para centralizar o poder na figura do rei e se depara com seu rival e meio-irmão, Dom Afonso, que disputa as atenções do Rei-menino. Na prática, o Duque de Bragança representava a reação feudal contra o centralismo monárquico encabeçado pelo Duque de Coimbra. Astuciosamente, aos poucos, os Braganças conquistam a apreciação do rei. A velha aristocracia portuguesa, ressentida com o fortalecimento da monarquia de Avis, e potencial aliada da monarquia castelhana, acabava por encontrar brechas para enfraquecê-la.

Em 1444, os portugueses iniciam um dos empreendimentos dos mais odiosos desde então: na cidade de Lagos, em Algarve, abrem o comércio de escravos negros na África. Em vistas a concorrer com o mercado árabe de escravos, em vigor ao norte da África desde o século VIII, compram escravos das tribos africanas e as revendem ao comércio europeu (particular, nas Ilhas de Açores e na Itália) e do Mediterrâneo. Posteriormente, com a descoberta e colonização da América, o mercado de escravos negros se expande para o Novo Mundo, tornando-se uma das atividades mais lucrativas da Idade Moderna. Por todo o litoral africano, são construídas feitorias portuguesas alinhadas com os reinos negros do Congo, Guiné, Moçambique e outras nações européias, como Inglaterra e Holanda, entram na disputa da mão de obra negra.

Inicialmente os portugueses capturavam escravos no litoral, através do puro despojo de guerra. Entretanto, viam que era mais lucrativo fazer alianças com as populações nativas, que já praticavam o escravismo com os árabes. Até então a moeda usada era o ouro da Guiné, com que os portugueses trocavam os cravos com os aliados africanos. Posteriormente, o tabaco também foi usado como moeda de troca até o século XIX.

Dom Afonso, agora Duque de Bragança, busca as atenções do seu sobrinho-rei e alimenta hostilidades contra o regente do reino, Dom Pedro, Duque de Coimbra. O casamento do príncipe herdeiro com a filha de Dom Pedro desagrada ao Duque de Bragança, que começa a causar intrigas e corroer as relações do futuro rei com seu tutor. Quando o príncipe Afonso é elevado rei, em 1448, é induzido pelo Duque de Bragança a anular todas as leis criadas na regência de Dom Pedro, a fim de demonstrar total independência política e autoridade sobre o reino. No entanto, o Duque de Bragança conspirava para derrubar o status de seu meio-irmão Pedro e enfraquecer a monarquia, ao manipular o próprio rei a conceder plenos poderes aos nobres. Calunia indecorosamente o regente Dom Pedro e conspira para jogá-lo contra o monarca.


Ao espalhar notícias falsas de uma suposta revolta contra o rei, este declarou o Duque de Coimbra um rebelde traidor. Pressionado pelas cortes, o rei obriga ao infante regente para que deponha às armas e suas tropas leais. O regente duque se recusa e o rei, furioso, manda a própria esposa falar com o pai, para que ele escolhesse sua pena de traição: a morte, a prisão perpétua ou o desterro. A rainha Isabel de Coimbra, aos prantos, aconselhara ao pai para que ele fosse exilado para a Inglaterra ou Hungria, onde tinha parentes e amigos. O Duque de Coimbra se recusara e armou suas tropas, marchando para Lisboa.

Isso acabou de levar o reino a uma guerra civil, e na sangrenta e feroz batalha de Alfarrobeira, no ano de 1449, o sogro do monarca, Dom Pedro, morre no campo de batalha. Algum tempo depois, arrependido, e por amor à esposa rainha, o rei reabilita a memória do sogro rebelde, dando um sepultamento digno de alta nobreza. No ano de 1455, a esposa do monarca, Isabel de Coimbra, falece, aos vinte e três anos de idade. Dom Afonso V passou uma boa parte do reino preocupado com as investidas bélicas ao norte da África, (daí a ser chamado, o “africano”). O rei encarnava o pensamento cruzadista, cogitando um exército contra os turcos, poucos anos depois da queda de Constantinopla, em 1453. O monarca, ao ouvir o clamor do papa Calixto III, chegou a organizar uma tropa de 12 mil homens, para lutar contra os turcos no cerco a Belgrado, em 1457. Todavia, o papa morreu um ano depois, e o plano malogrou, fazendo com que Afonso usasse suas forças na expansão da África. Em 1458, conquistou Alcácer Ceguer; em 1464, tomou Anafé e em 1471, conquistou Arzila, completando o domínio quase total dos Marrocos, ao capturar Tanger e Larache.


Depois das guerras na África, o rei Afonso interfere nos assuntos de Castela. Sua irmã, Joana, casada com o rei Henrique IV, de Castela, acaba gerando uma filha, também chamada Joana, só que rejeitada pela nobreza castelhana, por ser uma bastarda de um amante da rainha, Beltrán de la Cueva. Surgiram rumores da impotência sexual do rei espanhol, e a irmã de Henrique, Isabel, ajudava a espalhá-los, quando a filha da rainha assim foi chamada “Beltraneja”. Tal cognome era escandaloso, pois insultava a honra da princesa herdeira de Castela, já que fazia alusão o adultério da rainha, que posteriormente foi banida do reino espanhol. Quando o rei Henrique morreu, em 1474, uma parte da nobreza espanhola adere à tia de Joana, que é elevada rainha de Castela, sob o nome de Isabel I. No entanto, Afonso V não aceita a coroação e, em apoio à sua sobrinha Joana “Beltraneja”, casa-se com ela, em 1475 e declara-se rei de Castela, invadindo o reino espanhol. Uma guerra civil explode entre a nobreza de Castela, junto com uma guerra entre o reino português e castelhano. O Reino de Aragão intervém com suas tropas, na figura de Fernando II, esposo de Isabel e na feroz batalha de Toro, em 2 de março de 1476, as tropas portuguesas são desbaratadas no campo de batalha. Dom Afonso V fez um acordo com Luis XI, rei da França, para angariar apoio na logística militar contra Castela, mas o rei francês se recusa, preocupado com as investidas contra o ducado da Borgonha. Posteriormente, a França realiza um pacto de amizade com Castela e o rei português é forçado a aceitar a ascensão e legitimidade dos reis espanhóis, ao assinar o Tratado de Alcáçovas, em 1479, renunciando ao trono castelhano. Neste ínterim, em 1477, Dom Afonso V já havia abdicado do seu trono em favor do filho Dom João e depois volta atrás. O rei cai em depressão, e anos depois, falece no mosteiro de Sintra, em 1481, aos 49 anos de idade.

O príncipe João, filho de Afonso, foi elevado a Rei João II, e assim chamado “Príncipe Perfeito”, pela fama de homem astucioso, centralizador e por vezes, violento. O rei Afonso V havia negligenciado a administração do reino, já que vivia em guerras e mais guerras fora dele e deixava os poderes da monarquia aos nobres. Os seus parentes, os Duques de Bragança, tinham ganho bastante poder e influência, junto com uma aristocracia que era hostil à centralização real. Na prática, a Casa de Bragança era a família mais rica de Portugal e uma das mais ricas da Europa. Era a maior proprietária de terras de reino português e ainda possuía grandes propriedades em Castela, Navarra e Aragão. Se os Duques de Bragança, notórios conspiradores, poderiam manipular o rei Afonso V, já não poderiam esperar o mesmo no seco e temperamental João II, homem implacável e impetuoso. Na proposta de centralização monárquica, o rei acaba criando uma burocracia particular de procuradores reais, juristas e homens leais à sua autoridade, reduzindo o poder e os privilégios dos nobres, em particular de seus parentes. Isso desagrada uma boa parte da velha aristocracia, que se vê privada de sua força política, em face à onipotência da Coroa. E ressurge a velha aliança da nobreza portuguesa com os interesses monárquicos de Castela.

Há de se entender que o conceito de “nacionalidade” e de “Estado” ainda eram embrionários. A nobreza européia não nutria vínculos nacionais para com seus povos, mas tão somente vínculos familiares e dinásticos para com seus pares. Isso porque cada território de um senhor feudal possuía uma lei própria em que poderia reger sua cidade ou vila, e a relação de suserania e vassalagem, que consignava deveres mútuos entre a coroa e a aristocracia, implicava limitações ao poder do reino. A dúbia lealdade dos nobres portugueses com a Coroa tinha a ver com a idéia de que a influência castelhana enfraqueceria a monarquia portuguesa, e isso daria plenas forças para que a aristocracia controlasse o rei. Daí a entender que a “alta traição” da nobreza portuguesa não estava ligado a um conceito nacional e sim na quebra de lealdade na figura do rei. Se havia uma chamada “razão de Estado”, um termo impróprio na Idade Média, era na pessoa exclusiva do rei. Sabia-o bem Dom João II que não poderia confiar nos seus pares aristocráticos. E a tendência para enfraquecê-los, visava simplesmente limitar a ação política deles.

O rei, através de seus espiões, descobre uma correspondência secreta entre Dom Fernando, Duque de Bragança e os Reis Católicos Isabel e Fernando, visando conspirar contra seu reino. Nas cartas, o duque declarava-se hostil à política real e chamava-a de “tirana”, e suas opiniões, conhecidas pelos inimigos castelhanos, foram intoleráveis a Dom João II. Isso porque se falava de rumores de uma suposta invasão contra o reino de Portugal. Em 1483, Dom Fernando foi preso por traição, julgado e decapitado em praça pública na cidade de Évora. A família de Bragança foi banida de seus títulos, suas terras foram confiscadas e anexadas à propriedade da Coroa e o herdeiro do ducado, Dom Jaime, ainda criança, foi exilado pra Castela.

Porém, não foi a única conspiração. O homem mais poderoso de Portugal, depois do Duque de Bragança, era Dom Diogo, Duque de Viseu, primo e cunhado do rei, beneficiário do título ducal de Viseu, pelo infante Dom Henrique, seu tio. Desgostoso com a política real, o duque idealizou uma conspiração para assassinar Dom João. Numa audiência no palácio, o Dom Diogo é chamado à presença do monarca e quando aparece, é morto a punhaladas pelo próprio rei. Muitos outros conspiradores são impiedosamente executados, como o bispo de Évora, que é encontrado morto na prisão, envenenado.

No âmbito externo, os portugueses conseguem explorar toda a costa ocidental da África e constroem uma formidável fortaleza militar na Guiné, São Jorge de Mina, em 1482, garantindo as fontes primárias de ouro na região e drenando o comércio português. Comenta-se que para impressionar os nativos, o rei mandou uma pequena tropa de portugueses bem vestidos e armados até os dentes, reluzindo em armaduras, para impor temor e respeito a quem os visse. Na verdade, as minas africanas de ouro abasteceram a Europa de moedas de ouro, já que Portugal comprava roupas, cavalos, tecidos, latões e chumbo da Inglaterra, Irlanda, Flandes e Alemanha com moedas da Guiné. Os portugueses consumiam trigo do Marrocos e o reexportavam para toda o continente europeu, junto com especiarias, marfim, pimenta malagueta (vinda da África), metais preciosos e escravos. A afluência de ouro por intermédio de Portugal foi tão marcante, que séculos depois, alguns tipos de moedas que circulavam na Europa Setentrional eram chamados de “portugaleses”, em alusão às moedas vindas da Casa de Mina, centro comercial onde eram fiscalizadas as mercadorias vindas da África.

O rei, obcecado pelos mitos em torno do continente africano, em particular, da lenda de Preste João, monitorava de perto, as ações e atividades econômicas e militares de perto na África. Preste João era um mitológico príncipe cristão, que provavelmente vivia na Etiópia e era narrada sua existência por mercadores árabes, judeus e mesmo europeus. Uma lenda antiqüíssima, já que a história era ouvida na Europa, desde o século XII. A sua primeira menção foi em 1145, quando um bispo do Líbano relatava a descrição de um reino cristão para lá da "Pérsia e da Armênia", cujo governante era um rei-sacerdote, descendente dos reis magos. Ele se chamava "João, o presbítero", e na linguagem franca da época, foi batizado, "père", ou pai. Daí a corruptela portuguesa do nome "preste", que deu fama ao estranho monarca. A lenda contagiou o imaginário europeu, porque era relativamente comum, antes da expansão árabe, comunidades cristãs coptas isoladas ao norte da África. O reino da Abíssinia era cristão, e, embora sofresse as investidas dos islâmicos, a sua fé original foi preservada. Em 1490, Dom João II mandou enviar dois emissários, Pero de Covilhã e Afonso de Paiva, para descobrir o suposto reino. Os leais espiões do rei cavalgam por terras cristãs européias, até partirem ao norte da África. Passam por Alexandria, no Egito e, disfarçados de mouros, chegam ao Cairo. Encantados com a rico comércio da cidade islâmica, compram camelos, cruzam toda a Península Arábica e chegam até a Meca. Os dois cristãos romanos, numa cena cômica, fingem prestar reverência à cidade sagrada muçulmana, para preservar a farsa. Eles se separam, e Covilhã pega o primeiro navio para as Índias, enquanto Afonso de Paiva vai para Abissínia. Planejam o reencontro no Cairo, para depois voltar pra casa. Quando Covilhã, depois de ter viajado para as Indias, volta para o Egito, em busca do amigo, descobre, por intermédio de um judeu português, o rabino José de Lamego, que Afonso de Paiva estava morto, vítima de uma peste. Covilhã faz um relatório apurado sobre as Índias para o rei e o envia, por intermédio do judeu Lamego, que volta a Portugal. Anos depois, Vasco da Gama utilizaria as descrições de Covilhã para a procura de Preste João.

Então desce para a África, até encontrar a Abissínia, e para seu espanto, encontra um pequena comunidade cristã oprimida pelos islâmicos. Um rei, de nome Alexandre, se declara descendente de Preste João, e recebe muito bem o aventureiro português. Covilhã se prepara para voltar a Portugal, em 1494, quando o rei abissínio morre e os cortesãos o obrigam a ficar no país. O costume da terra impedia que um forasteiro saísse do país e Covilhã, casado e pai de uma criança, acaba se casando com uma etíope. Recebe terras e escravos, tornando-se um dos homens mais poderosos da região. Em 1508, é elevado a conselheiro da nova rainha Helena e, em nome dela, manda um embaixador da Abissínia para Portugal. Em 1515, o frade Francisco Alves acompanha um séquito diplomático português à Abissínia, com o objetivo de criar vínculos políticos. Anos depois, este eclesiástico relatou a fantástica historia de Prestes João e de Covilhã, na obra "Verdadeira informação das Terras de Preste João das índias", publicado postumamente em Portugal,em 1540, "Segundo Vio e Escreveo ho Padre Alvarez Capellã del Rey Nosso Senhor".



Com Bartolomeu Dias, os navios chegam ao Cabo das Tormentas, (depois batizado pelo rei Dom Manuel, como Cabo da Boa Esperança), aproximando o velho sonho lusitano de encontrar uma rota marítima para as Índias. No âmbito diplomático, Dom João II arranja um casamento dinástico entre seu filho, o príncipe Afonso, com a filha dos reis de Castela. Contudo, em 1491, o filho do rei acaba morrendo num acidente de montaria, aos 16 anos de idade, e isso frustra o sonho do Príncipe Perfeito, de querer unir os dois reinos mais poderosos da Península Ibérica. Portugal inteira ficou de luto e durante seis meses, os barbeiros-cirurgiões do reino se recusaram a cortar a barba e o cabelo dos súditos e fidalgos. Daí a moda das barbas grandes dos portugueses do final do século XV, em sinal de tristeza pelo príncipe morto. Em 1494, o rei consegue preservar seus domínios ultramarinos, com o Tratado de Tordesilhas, evitando, assim, uma guerra contra a Espanha. E, adoentado e sem herdeiros legítimos, recusa-se a elevar seu filho bastardo, Dom Jorge, e nomeia o seu primo, Dom Manuel, como herdeiro do trono português. Em 1495 falece e é enterrado em grandes pompas em Algarve.

Dom Manuel teve uma ascensão meteórica. Era irmão de Dom Diogo, Duque de Viseu, e dias depois de sua morte, aos 16 anos, foi chamado pelo monarca assassino. Temeroso pela sua vida, acabou por ganhar o título de Duque de Beja. Dom João II entrou para a história como o rei que promoveu a centralização monárquica, enfraquecendo e exterminando o poder dos nobres e impondo um séquito de pessoas sob sua autoridade. Aliás, sua fama e sua personalidade são paradoxais; seus contemporâneos nutriam um estranho sentimento de dubiedade e mesmo temor dele. Poderia ser gentil, amoroso, educado para com os seus pares, e ao mesmo tempo cruel, terrível para com seus inimigos. Daí a fama de “Príncipe Perfeito”, ou, simplesmente, nas palavras da Rainha Isabel de Castela, a Católica: “El Hombre!”. Há quem diga que tenha sido envenenado pelos seus adversários, (essa informação nunca foi comprovada), embora tenha promovido a rei, justamente o irmão do homem a quem assassinou publicamente na corte. Comenta-se que, três anos depois de sua morte, quando o rei Manuel fez uma imensa procissão para levar seu corpo ao Convento da Batalha, mandou que abrissem o caixão do rei: estava intacto, coberto de cal. Então o monarca mandou que soprassem o pó sobre o corpo e, num gesto de reverência, o rei beijou as mãos e os pés do cadáver.
(Dom Manuel e o caminho das Índias - 1495 - 1498).

Quando o navegador Cristóvão Colombo chegou às Américas, em 1492, este evento estarreceu os portugueses. Pela primeira vez, o reino de Portugal se viu ameaçado por uma potência intrusa em seus interesses marítimos. Se Castela era uma ameaça por terras, agora virou por mar. Os Reis Católicos espanhóis poderiam colocar tudo a perder quase um século de descobrimentos marítimos portugueses, já que eles competiam nas rotas para as Índias e, na prática, acabaram descobrindo um novo continente. Na verdade, os portugueses viram de perto a história, quando o próprio Colombo já havia se abrigado em Açores e acabou aportando seu navio em Lisboa, em 4 de março de 1493. Sua caravela “Niña” ameaçava afundar, avariada por uma tempestade violenta no oceano. Cristovão Colombo já era conhecido da Corte lusitana, quando ofereceu seus serviços ao rei Dom João II, propondo encontrar um caminho para as Índias, pelo lado do poente, a oeste do Atlântico. Colombo seguia o pensamento de um astrônomo italiano chamado Toscanelli, que em 1474, escreveu uma carta ao rei Dom João, afirmando que a rota das Índias poderia ser encontrada a oeste, diminuindo o decurso longo da costa africana. Porém, os judeus sábios da corte, tal como Abraham Zacuto, tinham rechaçado a idéia por soar quimérica e errada. Como o rei português não fez acordo com o navegador, ele acabou caindo nas graças da rainha espanhola Isabel a Católica, que financiou o projeto de conquistar a rota das Índias pelo oeste.

Na praia do Restelo, Colombo foi abordado por uma nau portuguesa, na pessoa do capitão Bartolomeu Dias, o mesmo que tinha chegado ao Cabo da Boa Esperança, e foi obrigado a descer de seu navio. Foi detido pelos portugueses e mandado direto ao rei. Colombo temeu por sua vida, pois sabia que o “Príncipe Perfeito” Dom João II não costumava ser piedoso com aqueles que divergiam de seus interesses. De fato, muitos cortesãos portugueses aconselharam o próprio rei para que o executasse sumariamente. No entanto, Colombo mostrou o seu salvo-conduto dos reis católicos, e, apresentado ao rei, disse que tinha descoberto o caminho das Índias para o poente. O rei e os cortesãos não acreditaram muito na história e creram que os espanhóis estavam quebrando o Tratado de Toledo, em que Espanha renunciara o direito sobre as terras descobertas pelos lusitanos na África Ocidental. Aliás, o rei disse a Colombo que os Açores eram portugueses e que qualquer investida de uma nau espanhola que passasse por aquela região, ameaçava a soberania do reino. Os portugueses se sentiram ultrajados, porque acreditavam que as terras descobertas por Colombo, poderiam ser de direito, posses do reino de Portugal. Dom João II mandou uma carta de protesto público contra as investidas dos Reis Católicos e os embaixadores dos dois países sentaram para negociar a divisão do mundo. Colombo foi liberado pelo rei e, aliviado, voltou para Sevilha, dando as boas novas aos reis da Espanha. Havia descoberto a América! Porém, Colombo acreditava ter chegado às Índias e deu essa notícia aos seus monarcas benfeitores. A Bula Inter Coetera não agradava aos portugueses, uma vez que dava como suspeita, as influências dos reis católicos sobre o papa espanhol Rodrigo Bórgia, ou Alexandre VI. De fato, a diplomacia portuguesa protestou contra a bula papal, ao afirmar a idéia de que os portugueses só herdariam águas na parte oeste. Muito se discute o grau de conhecimento dos portugueses sobre a existência da América. Alguns historiadores se convencem de que as exigências de Portugal contra a Espanha se deviam ao fato, bastante provável, de que os lusitanos sabiam da existência das terras a oeste do Atlântico, que pudessem ser exploradas em favor dos portugueses. Assinaram o Tratado de Tordesilhas e, no final, pacificaram as relações diplomáticas.



Todavia, Portugal estava numa situação embaraçosa. Precisava chegar o quanto antes às Índias, para resguardar o monopólio comercial sobre o oriente. A nação portuguesa já possuía tecnologia suficiente para criar uma nova rota comercial, já que tinha angariado influência geopolítica sobre toda costa da África Ocidental e chegara ao Cabo da Boa Esperança. Lisboa já era uma das cidades mais ricas da Europa e um dos maiores centros comerciais do mundo. Praticamente uma boa parte do capital europeu, vindo de Flandes, Inglaterra, França, Itália e mesmo Espanha, estava inserido na cidade portuguesa, financiando viagens à África e revendendo suas mercadorias para o resto do continente. Em particular, os banqueiros italianos de Florença, de Pisa e mesmo de Gênova, excluídos do mercado mediterrâneo, monopolizado por Veneza, viam no financiamento das rotas para as Índias, um grande negócio, capaz de derrotar suas rivais.

Porém, a coroa estava endividada e quando Dom Manuel declarou que reinvestiria no intento de buscar as rotas das Índias, irritou uma boa parte da nobreza portuguesa e das cortes, que não acreditavam no projeto. Todavia, Dom Manuel amenizou os ânimos dos nobres, ao escolher um fidalgo de alta linhagem para liderar a frota das Índias. Esse homem era Vasco da Gama.
01.Vasco da Gama – Enfim, Portugal chega nas Índias. . .

Os preparativos de uma viagem marítima de tamanha envergadura exigiam tempo, paciência e coragem. Os navios portugueses do século XV e XVI dispunham da mais avançada tecnologia da época. Além dos cascos serem mais resistentes e versáteis, os portugueses inovaram a caravela, ou seja, uma pequena nave de velas triangulares ou latinas, cujo mecanismo fazia com que os barcos velejassem contra a direção dos ventos. Relata-se o seu uso entre os portugueses, por volta de 1430, embora as caravelas já fossem conhecidas entre os navegadores gregos, que a chamavam de “caravo”, ou seja, “lagosta”. “Caravela” era diminutivo de “caravo” e assim ficou conhecido em Portugal. Por outro lado, os portugueses inovaram a tecnologia dos navios, ao inventarem a nau, um barco com velas triangulares e retangulares, que compensava tanto usar a força dos ventos, como ir contra a direção dele. Alguns historiadores afirmam que foi o próprio Bartolomeu Dias quem inventou o novo modelo de navio.

Por volta de 1480, os navios portugueses, antes usados como marinha mercante, foram armados com canhões e bombardas, por ordem do rei João II, para intimidar tanto as naves européias inimigas, como os próprios nativos da África. Na verdade, os formatos dos navios portugueses lembravam verdadeiros quartéis flutuantes, já que a construção da proa da popa se assemalhavam a um castelo sobre as águas. A comida era rigorosamente racionada entre os marujos, soldados e oficiais, e um despenseiro ficava responsável pela distribuição dos alimentos. Os tripulantes comiam cerca de 15 kg de carne por mês, cebola, vinagre e azeite, embora fosse permitido aos capitães trazer galinhas, ovelhas e outros mantimentos a bordo. Nos dias santos e de jejum, em particular, na Páscoa, era distribuído peixe, arroz ou queijo, para substituir a carne. As comidas eram temperadas com sal, azeite ou mesmo vinagre, que também era usado para limpeza dos alimentos e do porão. Porém, o alimento mais comum era um biscoito produzido para consumo interno dos navegantes, cuja fama era das mais terríveis: era bolorento, fedorento e cheio de baratas. Comenta-se que os marujos comiam tais biscoitos, junto com os vermes. Isto era associado a uma carrada de vinho e água por dia (cerca de um litro e meio), apesar de que, com as mudanças climáticas, a bebida alcoólica e mesmo a água, tinham um cheiro, por vezes, insuportável. A sujeira era comum, já que os ratos também faziam parte dos navios, e os marujos faziam suas necessidades fisiológicas dentro das embarcações.


A disciplina interna de um navio não somente refletia uma ordem militar, como uma rígida hierarquização medieval. No início, muitos navios foram guiados por capitães e pilotos de origem plebéia, embora alguns representassem a autoridade real. Todavia, a infiltração da nobreza no comando das armadas, modificou essa divisão. O capitão principal da armada comandava a armada pela nau-capitânia, enquanto o resto dos navios, e mesmo da nave de mantimentos, seguiam suas diretrizes. Abaixo do capitão, havia os pilotos e os estudiosos de navegação, que mediam a posição dos astros, e mesmo, dos ventos. Abaixo deles, vinham os contramestres e os guardas, que comandavam diretamente a tripulação, pela proa, popa e centro do navio e junto, a guarnição militar. Acompanhavam-nos, os artesãos, os calafetes, carpinteiros e tanoeiros, necessários para a manutenção dos navios, caso estes fossem avariados. Juntos, vinham os marinheiros, homens de sólido conhecimento técnico, que manipulavam as velas, observavam os mares e vestígios de terra pelas gáveas e remexiam as cordas e as diretrizes internas do navio. E a classe mais baixa desse grupo era a dos grumetes, garotos pobres e de baixíssimo nível social, que pegavam o trabalho mais severo e pesado, ao seguir ordens dos marinheiros. Muitos deles sofriam abusos de toda ordem e tinham o risco de serem até molestados sexualmente pelos marujos. Entretanto, a disciplina interna da armada era draconiana. A sodomia era punida com a pena de morte. Insubordinação e motim também não eram tolerados. A mera indolência de um marujo ou grumete poderia ser punida com o açoite ou espancamento da tropa. Os padres que iam nessas viagens proibiam carteados, jogos e impunham um feroz rigor sobre a conduta dos marinheiros. Mulheres eram inexistentes. Somente muitos anos depois é que as mulheres eram vistas nos navios, e mesmo assim, eram prostitutas ou órfãs do reino, dispostas a casamentos nas colônias portuguesas.

Foi com este espírito e o acúmulo de conhecimentos centenários, que o rei de Portugal, Dom Manuel, o Venturoso, escolheu um aristocrata para liderar a conquista das rotas marítimas das Índias. Vasco da Gama era o segundo filho do fidalgo Estevão da Gama e descendente de uma família, cuja genealogia se encontra, inclusive, na aristocracia inglesa. Não se sabe ao certo, a data de seu nascimento. Provavelmente nasceu por volta de 1469. Seguindo a tradição das famílias nobres, como segundo filho, Vasco da Gama quase chegou a seguir a carreira eclesiástica. Porém, nutria um espírito de aventura e guerra, já que não herdara os títulos de nobreza do pai, e queria ter brilho próprio. Guerreia contra os mouros, em nome do Príncipe Perfeito Dom João, ao norte da África e ganha notoriedade pela truculência, bravura e crueldade.


Anos depois, seu irmão, Paulo, é chamado pelo rei Dom Manuel, para ir às índias, só que se recusa liderar, em favor de Vasco. No dia 7 de julho de 1497, na presença das cortes de Monte-mor, o rei outorga a Dom Vasco, a liderança da sua pequena armada para o caminho das Índias. No dia seguinte, zarpou de Lisboa, pelo Tejo, liderando quatro navios e 170 homens. Conduzia duas naus, uma caravela e uma naveta de mantimentos. A nau São Gabriel era o navio do capitão Vasco, enquanto a nau São Rafael estava sob o comando de seu irmão, Paulo, e a caravela Bérrio era conduzida por Nicolau Coelho. Passando pelo Oceano Atlântico, chegara em agosto, a Cabo Verde, para abastecer, e seguiu direto. Navegou mais para oeste e viu sinais de terra, já que estava próximo do Brasil, quando virou a esquadra a leste, finalizando o trajeto na África Ocidental. Ao chegar no Cabo da Boa Esperança, enfrentou uma brutal tempestade, com suas ondas invadindo as frestas do casco, enquanto os navios balançavam como loucos no mar. A tripulação ficou apavorada com as águas que faziam tremer navios tão frágeis. Destemido e corajoso, o capital Vasco da Gama não se intimidou e, forçando a tripulação a seguir, acabou sendo o segundo navegante a ultrapassar o cabo tormentoso. Na prática, além do trajeto do cabo ser perigoso, os pedregulhos das águas poderiam encalhar ou mesmo destroçar os navios. Em 14 de março de 1498, Vasco da Gama chega a Sofala, zona litorânea e comercial de islâmicos e hindus, na costa de Moçambique. Os islâmicos e hindus da cidade viram com maus olhos as naus portuguesas, pois se sentiam ameaçados pelos europeus. Vasco da Gama, ao chegar à cidade, tenta, sem sucesso, encontrar informações sobre o lendário rei Preste João. Na ilha de Moçambique, são atacados por mouros, que os descobrem como inimigos cristãos, e Vasco da Gama manda bombardear a cidade, por retaliação. Em 7 de abril, chegam a Mombaça, e convidados pelo sultão local, temem uma emboscada. Recusam-se a descer e os portugueses vão embora do local. No dia 15 de abril, chegam a Melinde e encontram ventos mais favoráveis. O sultão local é mais simpático aos portugueses. Diálogo e troca de presentes causam boas relações entre as duas partes e Vasco da Gama liberta alguns mouros prisioneiros para o chefe da cidade. Em troca, o sultão oferece seu piloto árabe para leva-lo a Calicute, na Índia.

No dia 20 de maio de 1498, Vasco da Gama chega às Índias. Se os portugueses ficaram maravilhados com o intenso comércio na África oriental, não deixaram de ficar mais espantados com a riqueza, o fausto e a dinâmica da cidade indiana. O comandante da frota foi apresentado ao Samorim-rajá, ou melhor, ao “senhor dos mares” de Calicute, líder político da cidade. Inicialmente, Vasco da Gama, envolvido nas lendas de Preste João, acreditava que o príncipe de Calicute fosse um cristão e chegou a confundir um templo hindu com uma igreja. Quando os portugueses tiveram a sua audiência, no dia 28 de maio de 1498, eles se sentiram completamente intimidados. Esperavam um acordo diplomático, representando o rei de Portugal e se viram numa extrema mendicância, tamanha a riqueza daquele monarca oriental. O líder da cidade estava vestido de jóias e ouro, de cabeças aos pés, sem contar sua corte, que era um luxo sem fim nas roupas. Vasco da Gama chegara polido, afirmando desejar consolidar uma aliança entre tão grandes e poderosos reis. Todavia, pra consolidar a completa gafe diplomática, o capitão Vasco mostrou como presentes do rei de Portugal, ridículas oferendas ao príncipe indiano: açúcar, mel, azeite, chapéus. . .

Ofendido, o Samorim manda deter Vasco da Gama. O capitão, despitando a guarda indiana, orienta um marinheiro a avisar a seu irmão, que volte para Portugal e avise ao rei, da hostilidade do príncipe de Calicute. O marujo consegue fugir dos guardas e ir para a praia, até chegar a nau São Rafael. Paulo da Gama se recusar a ir e ameaça destruir Calicute pelos canhões e bombardas, se Vasco da Gama e sua tripulação não for solta. O Samorim, pressionado, acata a decisão do lusitano, enquanto a mourama, enfurecida, ameaça matar os portugueses na praia. Paulo da Gama chega com os comerciantes árabes e tenta negociar com eles, trocando tecidos e outras mercadorias por especiarias, acalmando os seus ânimos, por enquanto.

Em 24 de maio, o Samorim concede aos portugueses, o direito de vender suas mercadorias, enquanto são abertamente hostilizados pelos mouros e hindus da cidade. Os portugueses estão numa situação de vulnerabilidade. Quase três meses depois, em 19 de agosto de 1498, Vasco da Gama detém vários indivíduos ligados ao Samorim, como reféns, para negociar um acordo de comércio e a garantia da vida dos portugueses. O príncipe indiano se recusa a negociar e troca os lusitanos da terra, pelos reféns do navio de Vasco da Gama. Em 29 de agosto, a frota portuguesa abandona Calicute, sem cumprir o acordo de comércio entre as partes. Passam pela Ilha de Angediva, em Goa, e na data do dia 25 de setembro de 1498, um homem se apresenta, infiltrando-se na nau São Gabriel. Falando o dialeto de Veneza, dizia-se árabe, porém, cristão, e que servia um poderoso senhor com um grande exército, pronto a apoiar os portugueses. À primeira vista, Vasco acreditou na história, contudo, desconfiado, pediu para averiguar a informação e descobriu que era uma armadilha. Capturaram o pobre sujeito e o torturaram, com açoites e pingos de óleo fervente, para revelar a trama. Descobriu-se que ele era judeu convertido ao islamismo, e ele acabou negando qualquer trama contra os portugueses. Pelo contrário, declarava estar feliz em ver aqueles “francos”, ou melhor, aqueles europeus (os francos se confundiam no imaginário oriental com os cruzados) por aquelas plagas. Os portugueses não creram na história e o homem foi levado na viagem, para Portugal.

Como ele era um visivelmente inteligente e culto, acabou por conquistar as simpatias do capitão da frota, o próprio Vasco da Gama. Esse homem, quando chegou a Portugal, foi batizado no catolicismo, com o sobrenome de seu protetor, e virou cristão-novo, abandonando formalmente o judaísmo e o islamismo. Em homenagem aos reis magos, foi chamado Gaspar da Gama. Não se sabe ao certo onde ele nasceu. Supõe-se apenas que era eslavo, provavelmente nascido na Polônia ou na Bósnia, no ano de 1440, e era um arquétipo do verdadeiro judeu errante, praticante de suas tradições religiosas, e comerciante nato. Quando era ainda menino, foi viver em Alexandria, no Egito e conheceu vários lugares da Europa e da Ásia, em particular quase todos os entrepostos comerciais do mundo. Por volta de 1470, viajou pela Península Arábica e chegou à Índia, onde se converteu ao islamismo. Ao chegar a Portugal, virou presença marcante na corte portuguesa, quando detalhou ao rei Dom Manuel, o funcionamento e as rotas dos entrepostos comerciais árabes na Índia. Outra qualidade havia em Gaspar da Gama: a sólida cultura lingüística, causada por anos de viagem e conhecimentos dos mais variados povos. Ele dominava o árabe e o hindu e provavelmente sabia falar várias línguas africanas e européias. Poucos anos depois, ele se tornaria o “língua”, ou melhor, o tradutor da esquadra de Pedro Álvares Cabral.

Na mesma ilha de Angediva, os portugueses sentem dificuldades de zarpar, por causa da calmaria dos ventos, que não impulsionavam as velas das naves. Finalmente, no dia 5 de outubro, conseguem partir de volta para suas casas. Chegam de novo a Melinde, e a nave São Rafael, demasiado avariada, é abandonada e queimada, para que os árabes não tenham acesso às tecnologias arquitetônicas dos navios portugueses. Conseguem dobrar o Cabo da Boa Esperança e chegam na Guiné. Paulo da Gama, irmão do capitão, está muito doente, e, enquanto a caravela Bérrio, comandada por Nicolau Coelho, volta pra Lisboa, a nau São Gabriel ruma para Cabo Verde. Vasco da Gama entrega o comando da nave a João Dias, enquanto leva o irmão enfermo para o Açores, onde Paulo acaba por falecer. Volta enlutado, para Lisboa, em agosto de 1499 e foi recebido com grandes honras pelo rei. Se antes era um marginal da nobreza de sua família, Vasco acabou sendo elevado como “dom”, além de ganhar o título da fidalguia de conde de Vidigueira e Almirante do Mar das Índias. Mais de dois terços da tripulação da Vasco da Gama morreu na viagem e só 55 pessoas voltaram para Portugal. Se a viagem foi dispendiosa, cara e pouco compensatória, uma vez que os portugueses não conseguiram fincar feitorias comerciais nas Índias, contudo, Portugal conseguiu uma rota valiosa para o mar, a ponto de superar seus rivais europeus e árabes. As Índias, depois de quase um século de tentativas, estava ao alcance dos portugueses.
(Cancioneiro musical de Belém)


O Cancioneiro de Belém é coletânia musical renascentista, descoberta na Biblioteca do Museu Nacional de Arqueologia e Etnologia, em Belém, Portugal, e contém 18 peças musicais. O Cancionerio de Belém provavelmente foi publicado em 1603, embora suas peças tenham sido compostas até na segunda metade do século XVI. Fala-se então da chamada "música maneirista" lusitana, que é uma mescla de músicas vindas da tradição espanhola e ritmos da polifona flamenga, então vigentes em Portugal. Há de se notar também os modismos da Itália, em particular, na poesia e na instrumentalização musical. A grande maioria das autorias das peças do Cancioneiro de Belém são desconhecidas, embora possam ser identificados alguns mestres da música portuguesa renascentista, como Antonio Carreira, organista e Mestre de Capela dos reis Dom João III e Dom Sebastião. Encontra-se também nas letras, poetas da Renascença portuguesa e espanhola, como D. Manuel de Portugal, (Aquella voluntad que se ha rendido), Cetinna "la monja" (Ay de mi Sin ventura), Jorge de Montemor, (Flerida emn cuya mano) e Garcilaso de La Vega (O Mas dura que Marmor). A grande maioria das músicas retrata o conceito do pessimismo no amor, uma tradição comum na cortesania renascentista e no amor cortês medieval. Há também os vilancicos, peças pastorais que retratam cenas bucólicas e rurais. A peça "Pues a Dios humano vemos" é, provavelmente, uma peça de Natal, em comemoração a Natividade. Enfim, um universo musical em sons, na época dos Descobrimentos!
(Cancioneiro de Belém - Século XVI)

Tuesday, March 13, 2007

História Trágico-Marítima de Portugal I: Memórias do Império Marítimo Português.

Dizem que nas ruas de Lisboa do século XVI, as crianças brincavam de guerras de conquistas. Os meninos, munidos de espadas de madeira, pelejavam pelas ruas, como se fossem fidalgos lutando contra os mouros, enquanto as meninas, que assistiam a tudo, fingiam chorar, tal como suas mães. Na verdade, grande parte dessas crianças era órfã de pais, sumidos nos mares “nunca dantes navegados”, nas famosas palavras de Camões, em os Lusíadas. E suas mães, pobres mulheres de luto, que esperavam os maridos no cais, sem notícias de seus esposos e amados. Quando o Rei Dom Sebastião morreu na batalha de Alcácer Quibir, em 1578, os sebastianistas fanáticos dividiam as atenções com as donzelas no porto. Daí surgiu a frase, “ficaram a ver navios. . .”

Dois séculos depois, Bernardo Gomes de Brito publica uma coletânea chamada “História Trágico-Marítima”, relatos de terríveis naufrágios dessa época de epopéia, aventura, terror e morte que foi a “Era dos Descobrimentos” (nas palavras dos próprios descobridores europeus “achamentos”). É interessante pensar que o termo “descobrir” não faria sentido no século XVI: descobre-se o que está coberto, enquanto acha-se o que é perdido.

A história marítima portuguesa do século XVI foi uma das mais épicas e fantásticas que se há notícia. Ela mistura elementos do amor, da tragédia, do conflito cultural, das guerras e mesmo o sintoma mesmo da modernidade. A epopéia marítima de Portugal relata a separação das damas lisboetas e dos cavaleiros para as águas do Mar Tenebroso, dos imensos oceanos e suas frágeis naus, para descobrirem novos mundos ou morrerem na travessia. Retrata também a ligação do mundo, através dos mares e das rotas comerciais, que modificaram para sempre a história da humanidade. O mundo começou a se tornar pequeno, a partir daí. . .

No entanto, a história se inicia a partir do século IX, quando o comércio europeu começa a se revigorar, a despeito de séculos de estagnação mercantil. Nas cidades, surge um grupo de pessoas livres, sem vínculos com as classes aristocráticas, que investe em comércio. Não possuidores de terra, vivem das trocas e vagam por vilas e castelos, para vender suas mercadorias. Na prática, eram pequenos feirantes, excluídos das terras senhoriais, que faziam a vida nas cidades, transferindo mercadorias e serviços. Os mercadores, apesar de se locomoverem livremente, fincavam pontos comerciais onde poderiam ser encontrados ou fixassem moradia. Tais cidades onde viviam eram os burgos. E seus moradores eram os burgueses. E assim surgiu a sociedade comercial.

O comércio gerou uma revolução econômica na Europa feudal. Muitos servos fugiam ou abandonavam os feudos para tentarem a vida comercial e as práticas de mercancia eram uma oportunidade de sustento para muitos que se livravam dos pesados fardos da hierarquia medieval. A escassez de terras e a difícil aquisição destas, restringia a posse de muitos à atividade agrícola. A riqueza chama àqueles que a buscam e os burgos atraíram novas levas populacionais para as cidades. O mercado cresceu, e junto com elas, os burgos comerciais, com seu fausto de liberdade e prosperidade.



Outro fenômeno marcante das cidades medievais é a busca pela prosperidade. Pode-se dizer que a burguesia reinventou a idéia de ascensão social. O propósito de ascensão social e econômica era virtualmente ignorado, senão inútil, em boa parte da Idade Média. O status de cada indivíduo da sociedade medieval era determinado pelo nascimento e pelo caráter hereditário de sua família, cuja mobilidade social era quase nula. Um nobre nascia e morria nobre, como um camponês nascia e morria camponês. E mesmo a economia agrária e de subsistência não ajudava. A ética do trabalho e da acumulação de capital foi engendrado pelo pensamento burguês das cidades, em particular, dos prósperos comerciantes. Na velha divisão social dos cavaleiros que lutam, dos monges que rezam e dos camponeses que trabalham, o burguês era uma figura anômala, excluída das complexas hierarquias do sistema feudal.

Uma característica peculiar do burgo medieval era o grau de liberdade civil. As cidades comerciais eram governadas, em sua grande parte, por assembléias, e os cargos eram eleitos pela comunidade. Quem detinha algum tipo de propriedade na cidade, poderia eleger e ser eleito. Foram as cidades burguesas medievais que fundamentaram as primeiras legislações democráticas modernas. As leis civis, as comunas parlamentaristas dos moradores da cidade, o trabalho livre e assalariado, contrastavam com os domínios senhoriais dos nobres e reis da época. Perspectiva de vida melhor e liberdade civil era o melhor emblema dos burgos. Um provérbio medieval refletia esse espírito: “stadtluft macht Frei”, “o ar das cidades nos torna mais livres”. E, se for observado por uma ótica moderna, no êxodo rural para as cidades, qualquer camponês parece respirar essa liberdade que as cidades acalentam, em oportunidades e melhoras de vida.


No mundo medieval, esse espírito não era diferente, embora o processo desse êxodo fosse muito lento, gradual e durasse séculos. Se os bispados da Igreja evitaram a extinção das cidades medievais, o comércio acabou por reforçá-la. Embora elas crescessem em matéria de população, o número de habitantes continuava muito pequeno em comparação ao campo. Na verdade, as cidades medievais, apesar de ricas, eram muito desconfortáveis. As casas eram apertadas e as feiras muito sujas. O excesso de residências apertadas e justapostas umas a outras e seus telhados altos acabavam por escurecer internamente as ruas. Na verdade, as ruas eram verdadeiras vielas lamacentas e cheias de sujeira. Não havia calçadas e, no geral, a largura das vielas era do tamanho do ombro das pessoas. Era comum que elas se esbarrassem nas paredes e ficassem cheias de hematomas. Não havia esgoto: fezes, urinas, restos de comida, eram simplesmente jogados na rua e os ratos e baratas conviviam abertamente com os moradores. As muralhas dos burgos tornavam o clima interno ainda mais insuportável. Os setores comerciais eram divididos em cada rua ou passarela. Havia a “rua do Peixeiro”, a “rua do moleiro”, a “rua do tecelão”, cada bairro ou trajeto da cidade representando a prática de um ofício. Quando a cidade crescia além da muralha, era comum o complexo de casas se misturar com as defesas da cidade. Na melhor das hipóteses, construíam novas muralhas, para defender os novos moderadores. Porém, tal situação poderia ser considerada um certo luxo, se comparada à vida no campo, que não era menor pior.

Os camponeses, em geral, viviam em choupanas fedidas. Eram imundos e encardidos e dizia-se, parecia que a sujeira era o estado natural deles. Grande parte dos camponeses era tão pobre, que só viviam para trabalhar e comer. As roupas eram tão escassas, que muitos deles trabalhavam praticamente nus no verão, pra economizar as roupas no inverno. Conheciam momentos de fartura, quando as colheitas eram boas, mas a fome era uma regra comum. O cotidiano nessas vilas era parado, quase estático, e por séculos, era comum gerações conviverem com o mesmo estilo de vida de seus avós ou bisavós. Mesmo as mudanças eram sentidas muito lentamente nas cidades, que eram sonolentas. O mais estranho, contudo, é que uma boa parte dessas vilas camponesas não tinha nomes. Era perfeitamente possível que um camponês pudesse se perder de sua vila, se saísse do lugar. Ademais, nem mesmo as famílias camponesas possuíam sobrenome, privilégio das famílias aristocráticas. Uma boa parte dos europeus medievais só se conhecia pelo primeiro nome, ou, quando havia nomes idênticos, faziam distinções pelo nome do lugar, do oficio ou de uma característica física ou psicológica. Era possível identificar um camponês por “João do Lago”, ou “Luis Peixeiro”. Ou até “Pedro Feio”. Alguns patronímicos de plebeus ligavam-no às cidades de origem, como “Jean de Avignon”, “Manuel Lisboa”, ou mesmo os próprios sobrenomes aristocráticos da nobreza. Os plebeus da Europa, em particular, nos países católicos, só começaram a usar patronímicos registrados, a partir do século XVI, no Concílio de Trento.

A grande maioria dos camponeses residia em vilas isoladas, cujo contato com outros povoados era quase nulo. Essas vilas, muitas vezes, não contavam cem pessoas. As estradas eram íngremes e os salteadores e bandidos atacavam sob o menor descuido. Aliás, a informação, em geral, não circulava, já que imprensa não existia. Alguns fatos da história européia, como a mudança de papas e morte de reis, poderiam passar anos, sem que os habitantes camponeses da vila soubessem.

Havia mais gente dispersa nas florestas fechadas, matas e campos da Espanha, França, Itália, Alemanha e Polônia do que em qualquer cidade medieval. No final do século XV, cerca de 90% da população européia vivia no meio rural. Isso significava cerca de setenta milhões de pessoas que só viviam no campo, em aldeias e vilas pequenas perto das propriedades senhoriais. As cidades mais populosas da Europa não passavam de cem mil habitantes. A Itália, que no século XVI, contabilizava cerca de treze milhões de habitantes, e, portanto, era o país mais denso da Europa, suas cidades mais populosas, Nápoles e Veneza, contabilizavam, cada uma, cento e cinqüenta mil habitantes. O mesmo número populacional contabilizava Paris, na França, o país mais populoso da Europa, com quinze milhões de habitantes. Na verdade, as cidades mais populosas eram também as mais comercialmente prósperas. Tal facilidade se dava, porque algumas dessas cidades eram litorâneas ou viviam perto de rios ou estradas. Há de se lembrar que por uma boa parte da Idade Média, a maioria das estradas européias que ligavam as cidades era ainda do tempo do Império Romano.

As cidades italianas foram as pioneiras do florescimento comercial europeu. Isso é explicável porque, geograficamente, a Itália estava próxima do Mediterrâneo, tradicional via marítima para o comércio entre Europa e Ásia. Em parte, as cidades italianas se tornaram o caminho para a Terra Santa, por mar. Messina era a zona portuária para a cavalaria cruzada antes do Chipre e do Oriente Médio. Era uma cidade cosmopolita, cheia de mercadores bizantinos e árabes, tal como muitas no Mediterrâneo. Antes de ser o portal marítimo para o Mediterrâneo e a Palestina, Messina foi dominada pelos mouros, no século X. Em 1085, os normandos expulsaram os islâmicos e reconquistam a cidade. Se por um lado, a vinda de novos cavaleiros era sinal de novos clientes, por outro, as cruzadas causavam muita confusão nas cidades italianas. Multidões inteiras de mercenários vindos do norte assustavam os pobres citadinos italianos, que temiam ver seus bens roubados. Em particular, na terceira cruzada, houve uma verdadeira escaramuça entre os cruzados de Ricardo Coração de Leão e os moradores de Messina: como o alto contingente do exército inglês se encontrava nas portas da cidade, os preços dos alimentos subiram nas alturas. O rei não queria pagar o preço dos mercadores e o que se viu, no final, foi uma pequena luta, em que o próprio Ricardo cercou a cidade e ameaçava saqueá-la.

Com as rotas exploradas pelos cruzados, muitos mercadores acompanham os cavaleiros, em busca das especiarias do Oriente e, em particular, das Índias. No entanto, havia a rota terrestre, que ia da Alemanha até o Leste Europeu, chegando a Constantinopla. Foi por este caminho que a chamada “cruzada popular”, do fanático Pedro, o “eremita”, chegou à capital do Império Bizantino, em 1095. Quase dois séculos depois, no século XIII, essas rotas formaram novos empórios comerciais medievais entre os quais, na Alemanha, Flandes e Holanda, indo até a Escandinávia: a chamada Hansa Hanseática. A Hansa era um emaranhado de setenta cidadelas comerciais, que importava mercadorias do Oriente e as revendiam para toda a Europa central e do Norte. As suas principais cidades, Lübeck, Bremen e Hamburgo, organizavam essa liga multinacional de burgos. Sua intenção era proteger as cidades comerciais e as rotas da pirataria e mesmo de novos concorrentes.

Interessante perceber que o conceito moderno de “livre mercado” não era um fato na Idade Média. O comércio era visto dentro de um prisma corporativista, tal como as relações em geral, da sociedade medieval. As guildas e associações de oficio dos burgos visavam proteger os comerciantes associados contra os competidores rivais. Até as rotas se tornavam monopólicas: como a atividade comercial era uma concessão pública de um monarca e as rotas, um caso de conquista militar, as cidades comerciais, por vezes, entravam em guerras entre si. Na Itália, as cidades de Pisa, Genova e Veneza estavam em constante guerra pela disputa das rotas comerciais do Oriente. Por vezes, as cidades de Genova e Veneza financiavam as guerras internas do próprio Império de Constantinopla, disputando os pontos comerciais. Em 1204, Veneza conquistou seu passe livre para comercializar com o Oriente, depois que seus mercenários saquearam a cidade de Constantinopla e promoveram seu imperador. Em 1261, a dinastia dos Paleólogos conquista a cidade e o império expulsa os venezianos, promovendo seus aliados genoveses, que financiaram seu exército. Os pisanos e os florentinos ficaram de fora dessas rotas. Até os alemães sentiam a dificuldade do lidar com o preço das mercadorias, já que uma boa parte das vias do oriente estavam controladas pelas duas cidades italianas rivais. Genova e Veneza tinham primazia do comércio europeu, nos séculos XIII, XIV e XV, por uma seguinte razão: as duas cidades sabiam explorar as relações diplomáticas com o Império Bizantino e mesmo os rivais árabes e turcos. Se as rotas comerciais ficassem nas mãos de duas cidades, o mercado europeu poderia ser estrangulado pelos preços altos.


A epopéia portuguesa e a crise das cidades italianas.


Novas nações começaram a surgir no horizonte da sociedade medieval: diz respeito às monarquias nacionais, em particular, Portugal, a primeira nação-estado, de fato, a existir na Europa. A necessidade de usar as rotas marítimas dos venezianos e genoveses encontrava sérias dificuldades políticas e militares. A localização de Portugal, como o país mais afastado da Europa, não ajudava no trajeto para o oriente. Por outro lado, além das complicações militares com uma caríssima guerra contra os italianos e mesmo os turcos no Mar Mediterrâneo, havia o problema dos atravessadores árabes e hindus que transportavam as especiarias das Índias. Os comerciantes holandeses, franceses, espanhóis e mesmo os portugueses, poderiam fazer sociedades com os italianos, como de fato, existia. A dificuldade, contudo, é que o comércio da Europa ficava a mercê deles!

As mercadorias das Índias, para chegarem aos entrepostos comerciais do Ocidente, possuíam três rotas orientais: caravanas saíam da Índia, passando pelo norte da China e pela Ásia central e Oriente Médio, chegando até o Mar Negro; outras duas vias eram marítimas: navios árabes viajavam pelo Oceano Índico, passavam pela Península Arábica e subiam o Mar Vermelho, chegando a Gaza, na Palestina, ou a Alexandria, no Egito. Ou então, subiam o Golfo Pérsico até o Norte da África. O comércio das especiarias era muito lucrativo, compensando os enormes prejuízos dos investimentos em navios e mesmo em pagamento de transportes. Porém, as rotas eram difíceis e os riscos de investimento, altíssimos. Para sair da Índia e chegar à primeira feitoria italiana em alguma cidade da Grécia ou da Palestina, as mercadorias passavam por uma dezena de atravessadores. Mesmo os italianos estavam à mercê das tendências políticas e caprichos dos mongóis, turcos e os próprios bizantinos. E pagavam caro pela instabilidade. A queda de Constantinopla, em 1453, abalou as relações comerciais entre Oriente e Ocidente, já que os laços que uniam as cidades italianas ao império bizantino foram extintas. Os turcos hostis fecharam a entrada da Ásia e ameaçavam se expandir pelo Mediterrâneo, dificultando mais ainda as rotas comerciais para a Europa. Só a República de Veneza conseguiu ainda preservar velhas alianças com os árabes. É neste ínterim que entra o legado português na expansão do comércio e na abertura da Europa.

Antes da Revolução de Avis, em 1385, quando Portugal elevou Dom João I a rei, a nação lusitana já tinha uma longa tradição comercial e marítima, em parte, financiada pelos judeus do reino. A burguesia lisboeta, cristã ou judaica, tinha laços fortíssimos com os entrepostos comerciais ao norte da África e faziam sociedade, ora com os genoveses, ora com os venezianos, pela primazia das rotas comerciais. São conhecidas bancas comerciais portuguesas na Hansa Hanseática, uma vez que traziam mercadorias de Lisboa ou mesmo das cidades italianas de Genova e Veneza. No final do século XIV, o reino português fazia acordos comerciais com Genova, Veneza, Florença e Pisa, e transformava os banqueiros dessas cidades em sócios das bancas portuguesas. Grandes somas de investimentos europeus vão para Lisboa, uma das cidades que mais cresciam na Europa desde então.


Aliás, Portugal conseguiu unir o que havia melhor de tecnologia náutica daquela época, desde então. Com a ascensão do Mestre de Avis como rei de Portugal, grandes matemáticos e físicos cristãos e judeus eram largamente financiados pela monarquia e pelos mercadores portugueses. Instrumentos de origem árabe, como o astrolábio, o balestrilha, e estudos de astrologia e astronomia islâmicos e judeus eram fartamente conhecidos pelos estudiosos portugueses, que começaram a idealizar, a partir da tecnologia, o poderio que incrementaria o Império Lusitano. Já era tradição a construção de estaleiros para navios e os conhecimentos e engenharia náutica eram trazidos por navegadores mouros do Norte da África e engenheiros de várias partes da Europa. A idéia central era só uma: descobrir uma nova rota para as Índias. E o desafio principal era enfrentar o desconhecido Oceano Atlântico, o Mar Tenebroso, temido pelos portugueses. A expansão já começa no início do século XV, quando os lusitanos, depois de uma feroz batalha, conquistam a cidade de Ceuta, ao norte da África, em 1415. A intenção de tomar a cidade islâmica era no sentido de conquistar o comércio local africano e expandir a influência militar pelo Mediterrâneo, garantindo uma rota protegida de piratas mouros.

Um homem, contudo, acabou por incrementar uma revolução que modificaria para sempre Portugal. O Infante Dom Henrique, cavaleiro, guerreiro, filho da inglesa Filipa de Lancaster e herdeiro da tradição dos templários, na Ordem Militar de Cristo, idealizou uma sociedade de sábios astrólogos, astrônomos, matemáticos, físicos e engenheiros, dispostos a reinventar a náutica portuguesa: a Escola de Sagres. Investindo grandes somas da própria ordem na qual pertencia, o infante consegue modernizar a marinha portuguesa. Dizia-se que Henrique não somente herdou o físico da mãe loira e alta, como também seus gostos. Filipa de Lancaster era grande financiadora de conhecimentos náuticos, e afirma-se que o próprio poeta Geofrey Chaucer fez estudos a respeito, em nome dela.

A tecnologia náutica portuguesa do século XV acabou por se tornar uma espécie de segredo de Estado da coroa. Havia leis severas contra a venda ou mesmo a transferência de segredos náuticos para outras coroas rivais ou inimigas. Dizem que os reis portugueses puniam os espiões ou mesmo os traidores, costurando a boca deles. Mesmo as rotas marítimas, sendo desconhecidas por uma boa parte do mundo europeu, faziam parte dos segredos de Estado da monarquia e de seus investidores comerciantes e cientistas.

Há de se reconhecer também a bravura dos navegadores do século XV. Eram homens intrépidos, corajosos até a demência e se depararam com situações inimagináveis, pois enfrentavam mares desconhecidos e mares revoltos. Isso levou o sucesso do navegador Gil Eanes, que conseguiu ultrapassar o Cabo Bojador, na costa da Saara Ocidental, em 1434. O Bojador, até o século XV, era a fronteira última do europeu com o Mar Atlântico. Muitos mitos foram alimentados nessa perigosa travessia, já que uma boa parte dos navios que tentaram enfrentá-lo, acabaram nunca mais sendo vistos. Foi também nessa época que os Açores foram colonizados e anexados ao reino português. Em 1444, os portugueses descobrem o Cabo Verde e no final, acabam ultrapassando toda a Seara Ocidental e chegam na Guiné. Dai constroem os primeiros entrepostos comerciais na costa africana. Em 1460, os portugueses chegam a Serra Leoa e mais de vinte anos depois, Diogo Cão navegou pelo Rio do Zaire e estabeleceu relações comerciais com o reino do Congo. Em 1488, finalmente os portugueses quase dão a volta sobre o sul da África. Bartolomeu Dias chega ao Cabo da Boa Esperança, mas não consegue passa-lo, apavorados que ficaram os homens de sua tripulação.

Nesse interregno, países como Espanha e França começam a se interessar pelas navegações marítimas. Em 1492, Cristóvão Colombo, representando os Reis Católicos Isabel e Fernando, consegue chegar à América. Isso criou um atrito diplomático entre Portugal e Espanha, visto que o reino português se considerava fiel proprietário da exploração do Oceano Atlântico. Tal atrito quase levou os dois reinos à guerra. Espanha e Portugal já tinham assinado acordos, como o Tratado de Toledo, de 1480, que dava primazia para o reino português explorar com exclusividade as terras ao sul das Canárias. Todavia, a bula Inter coetera, assinada no dia 4 de maio de 1493, pelo papa espanhol Alexandre VI, estabeleceu a divisão do Atlântico entre ocidente e oriente, sendo que a linha demarcatória se localizaria a 100 léguas da Ilha de Cabo Verde. A Espanha tinha fincado posse nas América e exigia seus direitos de possessão sobre o território. Mas os embaixadores portugueses não admitiram a bula papal, porque sabiam que a faixa determinada pelo papa só lhes daria águas, ao invés de terras. Novas deliberações foram feitas, terminando no Tratado de Tordesilhas, assinado na data do dia 7 de julho de 1494, que determinava a divisão do oceano a 370 léguas da Ilha de Cabo Verde. Muito se discute a respeito das intenções portuguesas ao recusar a bula papal. Acredita-se que Portugal, embora não tivesse mandado expedições para explorar o território, sabia da existência delas, e pressionou a Espanha para um novo tratado. Isso garantiu aos portugueses toda a costa leste do Brasil e criou precedentes para o seu descobrimento e colonização.

Portugal construiu os caminhos para sua ascensão como potencia marítima, comercial e militar. No final do século XV, o reino poderia incrementar uma das epopéias mais desafiadoras que se há noticia: a tão sonhada rota para as Índias e a criação de um império comercial mundial. E no final, Lisboa se tornou a capital do mundo europeu. A continuação dessa história, contaremos em outra postagem.
(Cancioneiro de Elvas -Século XVI).