Sunday, January 14, 2007

Martin Codax, o segrel da Corte!


Pouco se sabe sobre a vida de Martin Codax. Ele viveu entre o século XIII e XIV na região de Galiza, na Espanha, e as únicas obras que sobreviveram foram as sete cantigas de amigo compostas em galego-português. Não se sabe ao certo se Codax era jogral, trovador, segrel ou menestrel, embora provavelmente fosse um segrel. Há de se fazer uma distinção terminológica entre jogral, segrel e menestrel para que o leitor entenda as relações estamentais do mundo medieval. O jogral era sempre gente do povo, que além de tocar músicas, fazia o papel de bufão da corte para o entretenimento dos nobres. Raramente os jograis compunham peças: antes, interpretavam e recitavam as poesias e peças alheias. Havia uma variação da palavra, o jogrel, uma espécie mais sofisticada de jogral, que acompanhava nobres e eclesiásticos. O segrel era um músico de inclinações eruditas, por vezes um ex-eclesiástico, que acompanhava um nobre ou uma corte, e compunha canções. Era quase sempre um homem de origem social média, (escudeiros ou plebeus distintos), com grandes qualidades intelectuais. O menestrel era um cantor errante, que chegava de cidade em cidade, vila em vila, corte em corte, fazendo apresentações em praças e cortes. O termo, posteriormente, se consagrou como musicista de capela, de catedral ou igreja. O trovador, ao contrário do jogral, do segrel e do menestrel, era um nobre de alta estatura social, que compunha peças para deleite próprio ou da nobreza. No entanto, com o tempo, essas distinções hierárquicas acabaram se mesclando, perdendo sua origem etmológica inicial.


As sete cantigas de amigo são as únicas trovas neste estilo que foram encontradas com partituras de música intactas. Porém, a pequena e valiosa obra reflete as tendências musicais da época: As contigas de amigo refletiam as tendências comuns da música islâmica e francesa, na idéia de dar voz à mulher aflita. Comenta-se que muitas cantigas de amigo são inspirados na poesia islâmica, conhecidas como muwassahas e zéjeles, que retratam o erotismo e a contemplação feminina, como protagonistas do canto. Aliás, quem escutar a sonoridade do canto musical das peças, perceberá uma leve influência árabe no uso da voz. Os instrumentos de corda que o digam, na figura da rabeca (em árabe, rabab) e no alaúde, (em árabe, ud), como companheiros dos trovadores e segréis da Corte. Cabe lembrar que muitas cantigas provençais de amor foram trazidas pelos cruzados do oriente, e adaptadas à realidade européia (embora os aspectos da cultura feudal e católica nas trovas provençais são particulares da sociedade européia medieval). De fato, muitas canções de amigo foram inspiradas nas cruzadas, já que os lamentos femininos são em nome do cavaleiros ausente, distante num campo de batalha no Oriente ou mesmo nas guerras da Reconquista Hispânica e Portuguesa. Tal estilo também é encontrado entre a corte francesa do século XII e XIII, e no mundo ibérico, a cultura provençal e islâmica acabam se entrelaçando numa identidade própria.
Não é mera coincidência que tal estilo de música se adaptou perfeitamente com a realidade das damas européias. O sujeito da canção não é o cavaleiro amoroso ou desdenhoso e sim a dama palaciana ou camponesa, que à espera do amado ausente, confessa suas agruras de amor a uma outra mulher, ou mesmo a um rio. Na verdade, tal situação reflete a condição das mulheres nos castelos e vilas, enclausuradas, que se confessam à pessoa mais próxima, ou seja, a mãe, a irmã ou mesmo uma outra amiga. Na canção de Martin Codax, a dama se dirige ao mar, à irmã, à Deus e à mãe, ao falar das dores da falta do amado. “Mia Hermana Fremosa, treides comigo”, confessa a dama para sua irmã. Em outra canção, a mesma donzela parece confessar ao amado: “Quantas sabedes amar amigo, trides comig´alo mar de Vigo: a banhar-nos-emos nas ondas”. Em suma, as cantigas de Martin Codax são uma das mais belas expressões musicais da Idade Média.
Martin Codax (século XIII- XIV)


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